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Jornadas Antonio Negri

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Por Altamir Tojal em 03 de junho de 2010 | Link | Comentários (0)


7, 8 e 9 DE JUNHO, NA FFLCH - FILOSOFIA / USP

O Grupo de Estudos Espinosanos da USP promove anualmente jornadas dedicadas a um filósofo ou a um tema. Este ano, em colaboração com a Pós-Graduação do Departamento de Direito da PUC-Rio / Núcleo de Estudos Constitucionais, o encontro será dedicado ao filósofo italiano Antonio Negri, um dos principais nomes do debate político-filosófico contemporâneo.

A proposta é discutir as contribuições negrianas, em especial a recente trilogia, escrita com Michael Hardt: Império, Multidão, Commonwealth.

Informações sobre o evento, programação e inscrição:

http://jornadasnegri.blogspot.com/

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Quem ler viverá

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Por Altamir Tojal em 27 de maio de 2010 | Link | Comentários (0)


Artigo de Luiz Fernando Brandão

Quase todo dia somos demandados a nos posicionar sobre as mais diversas questões - econômicas, políticas, ambientais e tantas outras. Para fazer isso com propriedade, a experiência e o bom senso recomendam uma boa leitura.

Uma das maiores livrarias brasileiras e da América Latina, detentora de mais de três milhões de títulos, começou recentemente a vender livros eletrônicos. E anunciou a novidade em todas as lojas de sua rede com um slogan bastante sugestivo: "O importante é ler". Sugestivo e feliz, ao resumir em quatro palavras uma questão que, por força da tendência humana em fazer escolhas a partir de extremos, para muitos parece inconciliável: papel ou digital, o que é melhor?

No cipoal em que arrisca enredar-se o senso comum -- não raro constituído de posicionamentos e opiniões equivocados porque incompletos -- na discussão sobre o destino da vida na Terra, nosso velho companheiro papel é há tempos objeto de um sem-número de questionamentos, e bastante injustiçado por sinal. Protagonista de boa parte do processo civilizatório, ele foi e continuará a ser importante na difusão do conhecimento e da cultura, na saúde, higiene e bem-estar das pessoas, assim como em diversas outras finalidades igualmente nobres.

Mas quem já não leu, na assinatura de uma mensagem eletrônica, o alerta "Antes de imprimir, pense no meio ambiente"? Ou o "Use papel reciclado, salve uma árvore", disseminado nas escolas por professores empenhados em conscientizar aqueles que, do nosso legado, construirão o depois de amanhã, em tempos de aquecimento global?

Ambas as sugestões reforçam cuidados importantes e necessários, mas sua interpretação numa leitura superficial pode induzir ao erro. A louvável intenção original -- conscientizar sobre a conservação da cobertura vegetal, os perigos do consumo irresponsável e a importância da reciclagem -- é atropelada por frases de efeito que não privilegiam o conhecimento aprofundado. As pessoas seguem sem paradas para reflexão a corrente dominante, e terminam convencidas de que é apenas na natureza do produto, e não também na forma como é fabricado e utilizado, que devem basear suas preferências e exercer a parte que lhes cabe na construção do futuro de seus filhos e netos.

Sérios equívocos já foram cometidos pelo homem, ao achar-se capaz de interpretar o comportamento do ambiente e interferir para ajudar. Lembra-nos o escritor Michael Crichton, no romance Estado de medo, entre inúmeros outros exemplos nessa linha, o ocorrido no início do século 20 no Parque Nacional Yellowstone, nos Estados Unidos. Nesta que foi a primeira área oficialmente designada como reserva ambiental no mundo, funcionários ciosos de sua missão, ao observarem mudanças no ambiente e julgando entendê-las, resolveram que a população de lobos crescera demais e trataram de exterminá-la. O desequilíbrio provocado pela intervenção radical na cadeia alimentar foi possivelmente um dos primeiros desastres ambientais da história moderna perpetrados com a melhor das intenções.

Faltava na época, como falta ainda em nossos dias, sobretudo para os leigos, um entendimento mais completo das questões relacionadas ao ambiente. A tendência ao engano embasado na interpretação simplista do que se apresenta como verdade absoluta prevalece. A constatação do erro, infelizmente, vem muito tempo depois, quando os efeitos podem ser irreversíveis.

Assim, por força da repetição, acredita-se que, como quase todos os papéis são feitos de madeira, por extensão seu consumo constituiria uma ameaça ao verde do planeta. Por isso, as árvores devem ser "salvas" -- uma verdade parcial. Esquece-se ou desconhece-se que, já há décadas, a maior parte do papel consumido no mundo provém de florestas renováveis para uso comercial, de rápido crescimento, cujo cultivo não apenas contribui para proteger e conservar as árvores nativas, a biodiversidade e os recursos hídricos, mas também é hoje, comprovadamente, uma das formas mais eficazes de estocar carbono e mitigar o chamado efeito estufa.

Ainda na década de 90, um estudo independente que é tão interessante quanto pouco conhecido foi encomendado ao Instituto Internacional para o Desenvolvimento Ambiental (IIED), de Londres, por um grupo de empresários desejosos de respostas confiáveis para essas questões. No trabalho, intitulado "O ciclo sustentável do papel", um grupo multidisciplinar rastreou a pegada de carbono de todo o ciclo de vida do papel e concluiu que seu uso sustentável é viabilizado por um conjunto de quatro expedientes: o emprego de fibras virgens oriundas de fontes renováveis; a reciclagem de parcela do papel usado; a incineração e a transformação em energia de parte do que foi descartado; e a destinação do restante a aterros sanitários.

De volta ao livro tradicional e ao eletrônico, ambos, como tudo na vida, têm vantagens e desvantagens. Assim como outros bens de amplo consumo, se fabricados e utilizados de forma irresponsável, acarretam prejuízos. E não necessariamente implicam escolhas definitivas e excludentes, como expressou com muita propriedade e a dose certa de emoção o articulista Gianni Carta -- evidente amante da boa literatura -- em edição recente da revista Carta Capital.

Acredito que só o conhecimento, o espírito crítico e a sabedoria, proporcionados entre outras fontes pela leitura, podem nos ajudar a superar as ameaças que as forças insondáveis da natureza, associadas ao modelo econômico prevalente no mundo dito civilizado, trouxeram à vida no planeta - as alterações climáticas, sem dúvida, a mais premente. O plantio de árvores para múltiplas finalidades, o desenvolvimento de tecnologias limpas para uma economia de baixo carbono e, evidentemente, o consumo esclarecido estão entre as frentes a serem exploradas nas adaptações que se impõem. Sempre fundamentadas em políticas públicas que privilegiem a educação.

Por paradoxal que possa parecer, escolhas pautadas por informação incompleta são tão arriscadas quanto as fundamentadas no completo desconhecimento. Quase todo dia somos demandados a nos posicionar sobre as mais diversas questões - econômicas, políticas, ambientais e tantas outras. Para fazer isso com propriedade, a experiência e o bom senso recomendam uma boa leitura. Quem ler viverá.

Luiz Fernando Brandão é consultor de comunicação, jornalista e tradutor.

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Fascínio pelo poder e resistência

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Por Altamir Tojal em 14 de maio de 2010 | Link | Comentários (1)


A gente sabe que as ditaduras sempre desmoronam, mas quanto antes melhor. Melhor ainda é que não se atrevam a acontecer. É recomendável, portanto, ficar esperto, ficar atento a elas e aos seus botes, nas formas conhecidas e também nas versões e configurações de cada hora.

Alguns, ou muitos, desconfiam que existe hoje um novo poder, onipresente e furtivo, que se deixa perceber somente em lampejos. Não o vemos inteiro, não compreendemos bem o que é, mas os sentidos nos dizem que ele segue os nossos cliques, registra as nossas conversas e nos acompanha o tempo todo, com as câmeras de cada canto, os chips de cada cartão e tudo mais que a gente sabe e não sabe que nos controla. Nada parece escapar a esse Grande Irmão.

É um poder inaudito, que pode isso e muito mais. Ele é, em si, uma questão. Vivemos o risco de uma ditadura total? Outra questão é a nossa atitude em relação a esse poder. Será que estamos nos entregando alegremente a ele? E mais uma: há como resistir a um poder que pode tanto e controla tudo?

O artigo 'O poder: medo e fascínio', de Daniel Aarão Reis, publicado no jornal O Globo em 9/5/2010, me remeteu a estas questões e, também, avivou uma antiga impressão que guardo do tempo de militante nos anos 60 e 70.

A impressão decorre da adesão da população à ditadura. Aquele regime se manteve por tanto tempo pela repressão e também pelo apoio de grande parte da população, da maioria. Lembro que uma vez, fugindo da polícia depois de uma manifestação, ouvi a gritaria 'Pega o comuna!' e tive de escapar também de tapas e pontapés no meio da calçada. Corria pensando "De que lado está, afinal, a merda do povo?". Foram muitas as cenas, os comentários, as atitudes, os gestos e as omissões que reforçaram em mim essa impressão.

A teoria confirma a impressão: o fascínio pelo poder e o horror consentido são pontos em comum às ditaduras de todas as cores e de todas as épocas, como destaca o artigo de Daniel Aarão Reis. O tema me interessa não só nas referências aos macropoderes, mas também aos micropoderes. As ditaduras perseveram mais ou menos fortes, mais ou menos explícitas, em países, em grandes e pequenas comunidades e também nas intimidades, sempre com a cumplicidade ambivalente de dominados, subjugados e controlados. Uma cumplicidade muito bem produzida.

Agora, tudo parece nos convidar a querer mais e mais controle, em nome da eficácia, da pressa, do conforto e da segurança. Até da liberdade. Sempre em nome da técnica, da ciência e do conhecimento. E ainda em nome do progresso.

Vale lembrar a resposta de Deleuze a Antonio Negri em 'Controle e devir': "Face às formas próximas de um controle incessante me meio aberto, é possível que os confinamentos mais duros nos pareçam pertencer a um passado delicioso e benevolente". A entrevista é de 1990.

De lá pra cá, o controle só faz crescer. Restaria, então, espaço para resistência?

É a velha questão de sempre, que separa quem se submete e quem resiste. Cada um é o que pode. O conhecimento que cresce o poder também cresce a resistência. E, agora, é possível que esse novo grande poder esteja mesmo é se apressando para enfrentar a grande resistência aumentada pelo conhecimento.

Eis o artigo de Daniel Aarão Reis:

O PODER: MEDO E FASCÍNIO

Num dicionário de lugares imaginários, Alberto Manguel e Gianni Guadalupi relacionaram uma Cidade do Medo, criada em 1874 por um certo James Thomson.

Em vez de uma utopia luminosa, Thomson propôs como quimera a Cidade da Assustadora Noite. Cingida pelo Rio dos Suicídios, sempre às escuras, arruinada, casas imensas e silenciosas, ruas estreitas, o lugar tem como patrona uma estupenda imagem de mulher alada: a Melancolia.

Os habitantes, principalmente homens maduros, os rostos cansados, desgastados, parecem surdos e cegos como trágicas máscaras de pedra.

Nunca dormem, vagueiam o dia todo e os pés nem fazem barulho nas pedras das ruas. Segundo viajantes de passagem, as pessoas sequer conversam, amedrontadas.

Thomson, num registro de senso comum, associou o medo à noite, à escuridão, ao silêncio, à ruína, à inatividade.

Mas o medo pode ser abordado e compreendido de outros ângulos.

Ao propor uma releitura de Hobbes, Carlo Ginzburg atribui ao pensador inglês, o ter colocado o medo num lugar central da filosofia política.

Na perspectiva de Hobbes, o estado de natureza não seria caracterizado pela sociabilidade, mas pelo seu contrário: a guerra de todos contra todos. O Estado teria, assim, emergido de um pacto parido pelo medo. O medo de que todos se matassem uns aos outros.

Em suas elaborações sobre o Estado, Hobbes, sempre segundo o pensador italiano, teria imaginado que os seres humanos constroem com o Estado relações marcadas mais que pelo medo, pelo terror. Um terror que os prende e sujeita, reverentes, transidos pela admiração. A criatura -- o Estado -- converte-se então num monstro -- o Leviatã, figura mítica, extraída da Bíblia, um imenso animal que os criadores já não podem mais controlar, porque imaginado como essencial para garantir a paz interna e a defesa contra inimigos externos, mesmo que à custa da renúncia de direitos considerados essenciais.

Para que o Estado dure, é preciso que o pacto original permaneça vigente, conferindo ao monstro, à criatura, o poder de, pelo terror, dobrar e dirigir a vontade dos criadores.

Hobbes propôs a discussão destas questões nos anos 40 do século XVII, tempos sem sol, de irrupções violentas, surpreendentes, quando surgiram na cena política, de todos os lados, vozes alternativas, delirantes, que não costumavam ser ouvidas. Os criadores, exaustos sob o jugo da criatura, ensaiavam destruí-la, recuperando o controle sobre seus destinos, como se o mundo houvesse virado de ponta-cabeça, na expressão de Christopher Hill.

Tomadas por desconhecidas energias, aquelas gentes fizeram e aconteceram, enforcaram o próprio rei, algo enorme até hoje, quanto mais naqueles tempos em que os monarcas eram figurados como emanação da própria divindade. Mas a energia desatada naqueles dias de turbulência esvaiu-se, dispersou-se. Vieram então outros reis, refez-se a paz, restabeleceu-se o Leviatã na tradicional catadura, terrível e bela, suscitando pavor, reverência e admiração entre os criadores, novamente encolhidos.

Em suas reflexões, Ginzburg enfatiza uma chave essencial: o monstro é produto da atividade humana, consciente e criadora.

No mesmo sentido irão as análises de um historiador alemão, Peter Reichel, sobre o fascismo e o nazismo.

As polícias políticas de Mussolini e Hitler esfolaram, torturaram e mataram, sem dúvida. Intimidaram e amedrontaram.

Contudo, inquietante é o encadeamento da coerção externa -- da repressão -- e do ânimo interno -- das gentes.

À violência do Estado combinou-se um crescente fascínio pelo poder.

Uma dupla face -- violência e fascinação.

Entre uma e outra, nuanças e ambivalências. Diz Reichel: não há apenas o terror exercido por uma elite criminosa e profissional sobre uma sociedade supostamente inerme e passiva, anômica, vítima de monstros invencíveis. Há a vontade fascinada pelo poder, porque para muitos, e tantos, é bela a aparência do terror, exercido por um Estado que oferece ordem, segurança, força, limpeza e prosperidade.

As ditaduras aparecem, por meio de tais interpretações, como atividade construtiva, fundamentadas em avaliações racionais e sentimentos apaixonados. Que se pense num Hitler, num Stalin, num Mussolini, num Fidel Castro, ou, no caso brasileiro, num Vargas ou na ditadura civil-militar instaurada em 1964. Ditaduras muito diferentes, sem dúvida, mas não é isto que está em questão, pois a comparação, como já aconselhava Marc Bloch, não há de se limitar aos semelhantes, pode e deve ser feita também, talvez principalmente, entre os diferentes. E o que há de comum em todas estas diferentes e exemplares ditaduras? A atividade consciente, a iniciativa construtiva.

Os tiranos, temidos, mas amados. O medo não mais paralisa, ao contrário, enseja atividade febril, frenética, às vezes, juramentos de morte e dolorosos sacrifícios aos quais as gentes aderem, agora exaltadas, com alegria.

O fascínio pelo poder. O horror consentido. A submissão voluntária.

Daniel Aarão Reis é professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF).

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PASSOS DA RENDA DE CIDADANIA NO BRASIL

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Por Altamir Tojal em 02 de maio de 2010 | Link | Comentários (0)


O Brasil tem uma lei que reconhece o direito à renda de cidadania. É uma importante diretriz política, mas a sua materialização terá de ser conquistada. E somente a vontade da sociedade pode tanto. Isso pede a nossa atenção para as experiências pioneiras de implantação da renda de cidadania, mesmo que sejam modestas, restritas e embrionárias.

Pelo menos três dessas iniciativas estão em curso no Brasil: Quatinga Velho (Mogi das Cruzes, SP), Paranapiacaba (Santo André, SP) e Santo Antônio do Pinhal, também em São Paulo. São experiências-piloto, em fases diferentes de realização.

Diretriz política

O Brasil é o primeiro país do mundo a ter uma lei que reconhece o direito de todo cidadão a uma renda suficiente para atender suas necessidades, de forma incondicional. Trata-se da Lei 10.835/2004, proposta pelo senador Eduardo Suplicy, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente Lula. Esta lei não obriga o governo em termos de recursos e prazos, mas é um passo importante como diretriz política.

O senador Suplicy entende que os programas de transferência de renda, principalmente o Bolsa Família, são etapas da implantação da renda básica de cidadania no Brasil. Isso pode ser verdadeiro, porque, no futuro, os recursos transferidos hoje de forma seletiva e sob condições poderão compor um fundo permanente para pagamento da renda de cidadania de forma universal e incondicional.

Transição problemática

Há, porém, diferenças substantivas entre os atuais programas e a renda de cidadania. A principal é a compreensão de que a renda de cidadania é um direito fundamental da pessoa e não um benefício social. Isso tem importantes repercussões políticas, em especial a autonomia do beneficiário em relação a partidos e governos. Há também grandes diferenças sociais e econômicas, que o senador Suplicy destaca com propriedade em seus pronunciamentos e nos seus livros.

A questão política é relevante na transição do conceito de benefício social, a exemplo do Bolsa Família, para o de direito fundamental, como é o caso da renda de cidadania. Isso porque os benefícios sociais tendem a ser apropriados como capital eleitoral. É, portanto, discutível que um governo - qualquer que seja - tendo um grande programa de benefício social em suas mãos, vá espontaneamente convertê-lo em direito universal de cidadania.

Experiências pioneiras

Essa transição terá, então, de ser conquistada. E somente a vontade da sociedade pode tanto. É neste contexto que merecem atenção e acompanhamento as experiências pioneiras de implantação da renda de cidadania, mesmo que modestas, restritas e embrionárias:

Quatinga Velho - Um consórcio de pessoas físicas, formado pelo Instituto de Revitalização da Cidadania (ReCivitas) começou, em outubro de 2008, a pagar uma renda de cidadania a moradores da comunidade de Quatinga Velho, em Mogi das Cruzes, SP. Proposto originalmente para durar um ano, o projeto foi estendido até outubro de 2010. Em dezembro de 2009, uma renda de cidadania de R$ 30,00 por mês estava sendo paga regularmente a 65 pessoas. Vale conferir o relatório dos primeiros seis meses da experiência.

Paranapiacaba - É outra iniciativa do ReCivitas, mais ambiciosa que a de Quatinga Velho. Trata-se da criação do Fundo Permanente da Renda Básica de Cidadania de Paranapiacaba (distrito de Santo André, SP), que se encontra na fase de captação de recursos. Também é um projeto no âmbito do terceiro setor, que pretende reunir empresas e pessoas físicas em parceria com a subprefeitura, o município, o governo do estado e do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, além de buscar o apoio de organizações internacionais.

Santo Antônio do Pinhal - A prefeitura deste município paulista criou o Fundo Municipal de Renda Básica de Cidadania, a ser constituído de receitas tributárias da prefeitura, doações de pessoas físicas e jurídicas e transferências dos governos estadual e federal. O projeto piloto conta com recursos da Corporação Andina de Fomento para desenvolvimento técnico e metodológico, incluindo a criação de banco de dados, estudo de viabilidade e aprimoramento da legislação.

De baixo para cima

Assim como as experiências originais de fundos de transferências de renda associadas à educação, como o Bolsa Escola, nasceram de iniciativas municipais e depois foram adotadas nacionalmente nos governos de Fernando Henrique e Lula - que instituiu o Bolsa Família - presume-se que a implantação da renda de cidadania possa seguir caminho semelhante, ou seja, de baixo para cima.

Em termos governamentais, a experiência pioneira de introdução da renda de cidadania ocorre no estado do Alasca (EUA) há mais de 25 anos. Uma renda anual, atualmente superior a US$ 1.500,00 é paga a cada cidadão, com recursos provenientes dos royalties do petróleo.

Congresso da BIEN

Uma importante oportunidade para conhecer e debater a renda de cidadania e as experiências nacionais e internacionais é o 13º. Congresso Internacional da Rede Mundial de Renda Básica de Cidadania, que será realizado em São Paulo, de 30 de junho a 2 de julho. O evento é organizado pela Basic Income Earth Network (BIEN).


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Renda de Cidadania e eleições

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Por Altamir Tojal em 09 de abril de 2010 | Link | Comentários (1)


Bolsa Família ou Renda de Cidadania? As transferências de renda e a caça ao voto. O debate sobre a autonomia política da renda da cidadania pode ser produtivo para a sua implementação, promovendo um salto qualitativo na compreensão do tema pela sociedade.

Goste-se ou não das políticas de transferência de renda, elas vieram para ficar e avançam tanto nos países pobres como nos mais ricos, por razões sociais e econômicas. Aqui no Brasil, a principal iniciativa dessa natureza é o Programa Bolsa Família. E há a Lei da Renda Básica de Cidadania.

A maior vantagem da Renda Básica de Cidadania em relação ao Bolsa Família é a autonomia política, ou seja, a eliminação ou redução drástica da subordinação a interesses de partidos e a programas de governo. Isso decorre da natureza da renda de cidadania: ela passa a ser um direito fundamental e inalienável das pessoas.

A renda de cidadania ou renda mínima é um valor monetário pago incondicionalmente a cada pessoa para assegurar a sua existência. É um direito de todos. Não é um benefício para miseráveis nem muito menos, como dizem alguns, uma esmola.

Isso pode parecer estranho para muita gente. E pode parecer exagerado considerar a renda de cidadania um direito fundamental. Talvez seja preciso mudar formas de pensar para compreender a coisa desse jeito. Mas, como ensina o senador Eduardo Suplicy, principal incentivador da RBC no Brasil, a ideia nem mesmo é novidade, muito pelo contrário. Isso está bem desenvolvido nos seus livros e sintetizado em artigo publicado no jornal O Globo (8 de abril de 2010). Para citar apenas os mais laureados, economistas como Edward Meade, John M. Keynes, Friedrick Hayek, Milton Friedman, James Tobin e John K. Galbraith desenvolveram propostas sobre o tema.

O Bolsa Família é um amplo programa de transferência de renda, um benefício concedido às pessoas mais pobres. Mas, como benefício dado a algumas pessoas e não a todas, este e os demais programas de transferência de renda sob condições acabam estimulando fraudes e ficando à mercê de vontades - mais ou menos legítimas - de obtenção de votos, de vitória nas eleições, de conquista e preservação do poder.

Há outras vantagens da renda de cidadania: reduz a burocracia e o custo de implementação; elimina o sentimento de humilhação de quem recebe; e não desestimula o trabalho e o desejo de ganhar mais. Numa sociedade que tende precisar cada vez menos do fator trabalho, a RBC é uma alternativa não apenas de justiça social mas também de sustentabilidade econômica.

O aspecto da autonomia política - ou desvinculação de interesses partidários - é pouco destacado nos estudos e debates sobre a renda de cidadania, inclusive pelo senador Suplicy. Isso decorre, certamente, da necessidade de conquistar apoio político para materializar a ideia. Ela já deu passos importantes no Brasil, como a Lei 10.835, de 2004, que autoriza o governo a introduzir a renda de cidadania, mas ainda não é levada suficientemente a sério.

O Bolsa Família pode ser entendido como uma etapa do processo de materialização da renda mínima, mas se desvirtua por ser usado como máquina de fazer votos. Mas a transição para a renda de cidadania precisa, como tudo na democracia, de apoio dos políticos e dos partidos. Portanto, pode não ser conveniente, no mundo real da política, chamar atenção para a natureza da renda de cidadania como direito fundamental e, muito menos, para a sua potência de se tornar livre ou menos suscetível de manipulações partidárias e eleitorais.

Cabe considerar, entretanto, que políticos, partidos e governos, embora sempre dependam de votos - e felizmente dependem - também se movem sob influência e pressão da sociedade, manifestadas não somente pelo voto. Assim, o debate sobre a autonomia política da renda da cidadania pode vir a ser produtivo para a sua implementação, promovendo um salto qualitativo na compreensão do tema pela sociedade.

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A ÚLTIMA HORA E SEU TIME DE JORNALISTAS

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Por Altamir Tojal em 03 de abril de 2010 | Link | Comentários (0)


A ideia de fazer jornalismo sem jornalistas talvez não signifique exatamente progresso para a imprensa e para a democracia.

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Fazer jornalismo com jornalistas pagos para exercer a profissão é uma conquista da sociedade que se materializa, nas democracias, em mais compromisso e qualidade, ou seja, mais liberdade de imprensa e cidadania da mídia.

Vale lembrar que não faz muito tempo a profissão de jornalista ainda era um bico no Brasil, o que condizia com o subdesenvolvimento do país e a precariedade das instituições.

O jornalismo era uma segunda atividade para a maioria dos seus fazedores. Raros eram os profissionais que viviam do trabalho nas redações. Tinham de ter outro emprego que lhes pagasse as contas ou se submeter a gorjetas.

Isso começou a mudar com a Última Hora, no início dos anos cinquenta. Seu criador e diretor por duas décadas, Samuel Wainer, introduziu níveis de remuneração que equipararam o jornalista aos demais trabalhadores, o que fez e faz diferença, não só para a vida do profissional como também para o produto do seu trabalho.

Não foi somente esta, nem foram poucas, as mudanças que a UH trouxe ou ajudou a consolidar na imprensa brasileira. Além de dono, Samuel atuava e se portava como jornalista, o que também faz grande diferença.

Ele e seu jornal eram comprometidos com a causa democrática e com a notícia, que são ou deveriam ser os valores mais caros do jornalismo. Introduziram no país um tipo de imprensa popular na temática, na linguagem e na forma gráfica. Com acertos e erros, a UH foi um dos mais importantes jornais que existiram no Brasil.

O livro 'A rotativa parou: os últimos dias da Última Hora de Samuel Wainer' conta, como aventura e drama, o fim desse grande jornal. É o relato de um momento marcante da imprensa e da história do país, através do olhar e da emoção de Benício Medeiros, então um foca, vivendo a dor e a delícia do primeiro emprego de repórter.

É, portanto, também um livro de memórias, que revive episódios e protagonistas da imprensa, cuja influência se estendeu por décadas e alcança o presente. É, ainda, uma obra que oferece o bônus da leitura sedutora, como um romance, às vezes comovente, outras engraçado, sempre incitante, com uma página puxando a seguinte.

Editado pela Civilização Brasileira, o livro traz uma coleção de fotos do acervo da UH carioca, selecionadas no Arquivo Público do Estado de São Paulo. Os episódios narrados foram vividos ou testemunhados pelo autor. Além de Samuel e seu time de jornalistas, há um desfile de personagens de destaque na vida política, empresarial e cultural da época.

Benício ficou somente pouco mais de um ano na UH, mas a sua narrativa dá conta não só das angústias e esperanças daqueles dias, no começo dos anos setenta, mas também do nascimento, ascensão, glória e agonia do jornal, que foi ferido de morte pelo golpe de 64 e resistiu aos trancos até imprimir a última edição em abril de 1971, um dos momentos mais sufocantes da vida do país. O título foi comprado e sobreviveu por mais alguns anos. Era, porém, outro jornal, apenas como o mesmo nome.

Não foi por acaso que a UH sofreu o estertor no curto período do primeiro trabalho de Benício. Aquele foi o momento mais tenebroso da ditadura brasileira, com a propagação da tortura e do assassinato nos quartéis e, é evidente, com a censura calando a imprensa.

À sua folha de serviços prestados à imprensa, Benício acrescenta mais este. Ao contar o fim da UH, relembra o terror e a vergonha da época, o que nos ajuda a refletir sobre vontades de censura que agora se renovam. Ao lembrar o começo da profissionalização na imprensa, nos anima a imaginar que a ideia de fazer jornalismo sem jornalistas talvez não signifique exatamente progresso para a imprensa e para a democracia.


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EM CIMA DA ONDA

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Por Altamir Tojal em 20 de março de 2010 | Link | Comentários (1)


A AVENTURA DE FOTOGRAFAR, DENTRO D'ÁGUA, O SURF NAS ONDAS MAIS FAMOSAS DO PLANETA

Pedro Tojal, meu filho, é fotógrafo aquático de surf. Muita gente acha que é uma das atividades mais prazerosas que existem. Eu também acho. O trabalho é feito em lugares bonitos, com gente interessante, em contato com a natureza e por aí vai. Também exige coragem, disposição física, conhecimento do mar, técnica e aquele olhar. Não é pouca coisa.

Ele trabalha para a revista Surfar. Esteve, ano passado, no Tahiti e México. As duas viagens renderam capas e muitas páginas publicadas. Segundo a revista, 'Pedro é conhecido por captar ângulos inusitados em situações de grande perigo nas bancadas rasas e afiadas de corais'. Em dezembro passado, embarcou para o Hawaii com a missão de trazer o melhor da temporada.

O resultado está na edição de março da revista, a partir da página 80. Além das fotos, a matéria '10 ângulos de Tojal em águas havaianas' conta como as fotos são feitas embaixo, dentro e em cima das ondas.

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Marieta conta novidades do passado

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Por Altamir Tojal em 17 de janeiro de 2010 | Link | Comentários (0)


Mamãe no Bar Lagoa

Mamãe estava ótima hoje no almoço no Bar Lagoa. Tem estado ótima nas últimas vezes. Disse, depois do primeiro chope, que andava deprimida, mas foi só beber aquele e já estava bem. Contou novidades do passado. As histórias se repetem mais quando a gente envelhece. Hoje ela contou algumas das velhas, mas veio coisa nova. Um passado novo, fresco. Em casa, depois do almoço, Val disse que estava pensando nas tardes de domingo com a família, em Bonsucesso, quando era criança. Os pais iam dormir. Ela lembrou de um trecho que tinha lido no jornal de ontem: "tudo fica lá atrás, nublado como um conto de fadas" (Bete Orsini, perfil de Julio Rego, no Ela). Surgem às vezes, nessas nuvens do passado, imagens cristalinas, como a água da cacimba da casa em Maceió. Talvez provocada pelo sabor do chope, mamãe lembrou da água dessa cacimba, a mais saborosa que ela bebeu. "Água que se bebe com gosto". A cacimba ficava no quintal da casa em que foi morar com Pedro. Um quintal comum a umas seis casas. O trem passava bem na frente. A jovem e bela Marieta acordava com o apito do primeiro trem, às dez da manhã. "Era água de uma vertente, limpíssima". Imagine o sabor dessa água. Mamãe também contou uma história de 1938, quando anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar. A menina Marieta vivia e trabalhava com um tio, o Tio João, em Atalaia, "um lugar onde nada acontecia". Era da parte mais pobre da família e trabalhava de graça na loja do tio. A coisa mais divertida era jogar víspora. A sogra do Tio João, a Babu, "uma mulher muito bonita, um mulherão", dava quinhentos réis de vez em quando para Marieta ir jogar. Se perdesse, estava perdido; se ganhasse dava tudo pra Babu, que não queria o dinheiro, mas Marieta não podia ficar com nada. Não tinha salário, como ia justificar ter dinheiro? Babu podia ser avó de Marieta, mas eram amigas e confidentes. Babu ajudava a amiga como podia, se preocupava com ela. Gostava de jogar, perdia o dinheiro que o filho mandava da Bahia e ainda fazia dívidas. O filho cortou a verba, mas Babu tinha uma chave do cofre do Tio João e às vezes pegava algum "emprestado". Na noite em que o mundo ia se acabar, Babu encheu uma tigela de leite e pão e se empanturrou. Não ia morrer de barriga vazia.

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Comece mais cedo o Carnaval Carioca

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Por Altamir Tojal em 08 de janeiro de 2010 | Link | Comentários (0)


Quando o espetáculo começa, a gende se sente dentro do Carnaval Carioca e vai imaginando os prés, os blocos, as fantasias, a cerveja gelada e tudo mais. Grande e boa ideia essa de reestrear o musical Sassaricando na temporada pré-carnavalesca.

Lançado em 2007, Sassaricando volta com o mesmo alto astral, a mesma alegria, a ótima seleção de músicas, belas interpretações e ainda mais teatral e engraçado. Está agora no Teatro Carlos Gomes, a preços populares.

O musical é uma crônica da vida da "cidade maravilhosa" nas últimas décadas, contada com a interpretação bem humorada e brejeira de uma seleção de dezenas de marchinhas de carnaval, feita pelos criadores do espetáculo, Rosa Maria Araujo e Sérgio Cabral.

É um desfile de músicas gostosas e maliciosas de autoria de um super time de compositores, como Noel Rosa, Ari Barroso, Lamartine Babo, Haroldo Barbosa e João de Barro, o "Braguinha".

O elenco de cantores é formado por Eduardo Dussek, Inez Viana, Pedro Paulo Malta, Pedro Miranda, Alfredo Del-Penho e Juliana Diniz, acompanhados por uma banda de sete núsicos, também é um timaço.

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Sol forte no céu e crepúsculo no fundo do mar

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Por Altamir Tojal em 01 de janeiro de 2010 | Link | Comentários (0)


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Estávamos entre o fundo e um teto opaco, um caldo de microalgas. Era quase um mergulho noturno. Somente um pouco da luz do sol atravessava o caldo, criando um ambiente crepuscular debaixo d'água.

Água ruim não significa mergulho ruim. O mar da Cidade Maravilhosa estava muito feio no domingo depois do Natal (2009). Parecia uma mistura de caldo de cana com chocolate derretido. Isso na superfície. No fundo estava claro. Fizemos mergulhos diferentes, estranhos mesmo, mas isso é que deu graça à coisa.

Foi a primeira saída oficial da Mar do Mundo, a operadora de mergulho do Pedro Bonfatti, instrutor e amigo. Partimos da Marina da Glória, no Guaiuba. Domingo de sol e muito calor. Sabíamos que o mar não estava bom por conta das microalgas que enfeavam as praias há alguns dias. Mas tínhamos esperança que melhorasse mais adiante. Estava e continuou péssimo, na verdade. A ideia era irmos para Maricás e descer no naufrágio do Moreno. Mas fomos mesmo para o Portinho, na Rasa, que fica mais perto.

Metade do grupo não desceu no primeiro mergulho. Alguns estavam concluindo o curso básico e o Pedro achou melhor abortar. Outros não acharam agradável cair naquela água.

Descemos uns dez ou doze, guiados pelo suíço-carioca Thomas. Os primeiros oito a dez metros eram de invisibilidade. Mas depois a água estava clara. Não sei calcular bem, mas creio que tínhamos uns quinze metros ou mais de visibilidade, o que não é mau no Rio de Janeiro. Eu estava na frente e podia ver todo o grupo quando me voltava. Havia vida razoável. A água estava morna na parte escura, acima, mas muito fria embaixo. O meu computador marcou 17 graus. Mas com o calor lá em cima, foi até refrescante. Acho que a água fria ajudou a desanimar a turma para o segundo mergulho. Então, descemos apenas o Fabiano e eu.

O que me agradou mais nestes mergulhos foi exatamente aquela condição estranha. Estávamos entre o fundo e um teto opaco, um caldo de microalgas. Era quase um mergulho noturno. Somente um pouco da luz do sol atravessava o caldo, criando um ambiente crepuscular debaixo d'água. Eu já tinha feito mergulhos parecidos lá mesmo na Rasa, porque a visibilidade no mar do Rio é fraca com freqüência. Mas esses foram mais bonitos e emocionantes.

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